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Migrar com direitos e saúde: tem início a Primeira Plenária Saúde e Migração em tempos de COVID-19

Atualizado: 21 de jul. de 2022

Por Beatriz Ventura

Há duas semanas, a região Sul deu início à fase regional da Primeira Plenária Nacional de Saúde e Migração. Idealizada em duas etapas, a primeira fase tem como objetivo abranger as particularidades das cinco regiões do país (Norte, Nordeste, Sudeste, Centro-Oeste e Sul), dando base para os debates e aprovação de um documento final de propostas em sua segunda fase, de caráter Nacional.

Além de evidenciar e debater os desafios frente à pandemia de COVID-19 bem como seus efeitos sobre a migração e a mobilidade humana, a Plenária visa abranger a transversalidade entre oito eixos propostos: gênero e raça; trabalho e renda; Inserção; cultura e regularização migratória; SUS, seguridade social, acesso à saúde e interculturalidade; saúde mental; educação; gestão biopolítica da pandemia; e, moradia.

No evento de abertura, Alexandre Branco Pereira, consultor do CDHIC, coordenador da Rede e membro da comissão organizadora, ressaltou a importância do evento para mobilização e engajamento dos atores brasileiros no debate sobre saúde e migração.

“A plenária surgiu de uma ideia inicial conversada entre o CDHIC e a CUT para debater os impactos da pandemia, acesso à saúde e a direitos sob a população migrante. A pandemia evidenciou que, quando estamos falando de saúde não estamos falando apenas de biomedicina e métodos terapêuticos, mas estamos falando sobre muitas coisas”.

Concebida para ser majoritariamente um espaço de escuta e participação, a Plenária é composta por atividades autogestionadas propostas por organizações, coletivos, sindicatos, associações, pesquisadores, e, principalmente, por migrantes, os quais a participação integral é fundamental na elaboração de políticas e acesso adequado a seus direitos.

Abdou Iahat Ndiaye, conhecido como Billy, representante da Associação de Migrantes Senegaleses de Caxias do Sul, em um relato de comparação com as dificuldades de acesso à saúde em seu país, Senegal, ressaltou, mesmo com toda precariedade e dificuldades enfrentadas, a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, de sua total gratuidade, universalidade, integralidade e equidade.

“A saúde lá (Senegal) não avançou, a gente sofre muito. As pessoas chegam a ter medo de ficar doentes. É muito triste, a gente ora para que nossa família não passe isso, para eles não ficarem doentes, porque, se ficarem doentes, é complicado mesmo. Eles não entenderam que a vida é importante, que se um cara está passando mal e você deixa ele ai, ele vai morrer.”

Para além da importância de sua gratuidade e universalidade, Denise Jardin, professora do departamento de antropologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ressaltou a importância da pretensão de pluralidade do SUS, incluindo não somente a diversidade da população brasileira mas, como, também, de todos os migrantes que compõem a pluralidade nacional. Nesse sentido, a antropóloga frisou importantes avanços em relação à percepção das instituições públicas antes condicionadas somente à vigilância e ao controle dos fluxos migratórios e não ao atendimento das demandas da população migrante.

Vale a pena destacar também em sua fala o questionamento de que, apesar das vozes dos migrantes terem sido amplificadas nos últimos tempos através de ONGs e da presença da sociedade civil em conselhos de saúde, ainda há pouca ou nenhuma presença dos próprios migrantes nesses espaços, seja em conselhos ou mesmo dentro dos serviços públicos, impedindo assim que as necessidades dessa população seja vista pela visão dos próprios migrantes.

Uma vez que a população migrante não possui direito ao voto, principal instrumento de escuta dentro de uma democracia liberal como lembrado por Alexandre Branco, outro tema de forte relevância para participação migrante é o direito à associação. Jesus Delgado, Presidente da Associação de Venezuelanos em Foz do Iguaçu, no Paraná, relatou os obstáculos enfrentados na garantia desse direito apesar deste estar previsto pela Nova Lei de Migração de 2017. Jesus expôs ainda as dificuldades enfrentadas no que tange às questões de trabalho, ainda mais agravadas pela pandemia. A falta de documentação além de impedir o acesso ao trabalho e a benefícios sociais, provocou crise até mesmo entre os migrantes que já estavam vivendo no Brasil antes da pandemia, uma vez que muitos nem sequer tem conseguido renovar seus documentos.

Como impacto da pandemia, além da paralisação nos atendimentos sociais, a proibição da entrada de migrantes somente por via terrestre e não área reforçou o caráter de seletividade destacado pelo educador social da Cáritas Brasileira Regional Santa Catarina e doutorando em Relações Internacionais pela UFSC, Jean Samuel Rosier. Haitiano, há 10 anos no Brasil, Jean fez importantes considerações sobre xenofobia, racismo e o acolhimento seletivo. Destacou ainda o avanço das lutas da sociedade civil contra xenofobia em contradição com a pouca ação do Estado e até negação da existência de racismo no Brasil.

Sobre o tema, Geraldine Ruffato, assistente social do Centro de Atendimento ao Migrante de Caxias do Sul, reforçou:

“Falando desse contexto da pandemia de COVID-19, as interfaces entre migração e saúde encontraram um novo elemento. As próprias políticas de combate a pandemia tem afetado diretamente os fluxos migratórios, como por exemplo o fechamento das fronteiras a partir desse controle sanitário, demonstrando uma desigualdade muito grande no próprio direito à migração, certa elitização desse direito e um recorte de classe.”

O evento seguiu com a exposição de atividades as quais resultaram na apresentação de mais de 30 propostas debatidas e aprovadas na Plenária Final da região Sul. Com mais de 100 registros de presença, os dois dias de debate contaram com 34 organizações, serviços e instituições representadas, além de migrantes de Cuba, Venezuela, Paraguai, Haiti, Senegal e Colômbia. O documento com tais propostas pode ser consultado no site da plenária e você pode acompanhar a gravação de como foram as etapas Regionais Sul, Centro-Oeste e Nordeste pela página do Facebook da Primeira Plenária Nacional Saúde e Migração.

Para acompanhar as próximas estampas e para mais informações, acesse: https://www.plenariasaudemigracao.com/.



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